“Congados – canto, dança e devoção do corpo negro”

CONGADOS

Canto, dança e devoção do corpo negro

Por Daniel Arrebola e Ana Paula Pereira


A exposição Congados: canto, dança e devoção do corpo negro traz a exibição de 30 imagens.

Através de pesquisa para os departamentos dos Programas de Pós-Graduação em Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – PPGPS/UENF, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Espírito Santos – PGCS/UFES e a Unidade Experimental de Som e Imagem – UESI/UENF, do antropólogo Daniel Arrebola e da bióloga Ana Paula Pereira, que realizaram imagens dos preparativos e ações dos quatro dias da Festa de Nossa Senhora do Rosário, em Dores do Indaiá – MG, nos anos de 2019 e 2022, registrando as ricas manifestações culturais dos Congados e das Cavalhadas, que compõe a Festa.

Nas entrevistas com congadeiros e devotos fica marcada a forte influência das tradições negras na festa. Portanto, as imagens da exposição pretendem retratar a devoção aos santos e santas católicos através da ótica das danças, dos cantos e da devoção popular, com olhar especial ao negro.


CORTEJO DOS MASTROS

A alvorada da sexta feira, onde os grupos de cada comunidade saem em caminhada no meio da madrugada passando pela casa dos Reis dos Mastros para conduzi-los até o Morro da Capelinha. É lá que a Festa irá começar. No trajeto essa é a cena mais comum: devotos que saem de suas casas para assistir o início das festividades e para pedir a benção de Nossa Senhora e dos santos através dos objetos sagrados da Festa, as bandeiras e os mastros.

Imagem: Daniel Arrebola, 2022



MORRO DA CAPELINHA

Após a peregrinação pelas ruas das comunidades, acompanhando e fazendo a guarda dos Reis dos Mastros, os grupos se reúnem no Morro da Capelinha, em frente a Capela de São José, de onde sairá uma grande caminhada até a Igreja de N. S. do Rosário. A frente da capela estão devotos que aguardam e assistem as louvações dos ternos e se preparam para a saída. Enquanto são feitas as louvações, rezas e cantos dos ternos que chegam um a um no Morro da Capelinha, lá embaixo, na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, os fogos iluminam a noite de Dores do Indaiá. Do Morro da Capelinha se vê toda a cidade e os fogos, acordando os devotos para o início da Festa do Rosário. Depois de assistir a linda queima de fogos e dos cantos e orações dos ternos em frente a Capela de São José, é hora dos congados conduzirem as imagens e os mastros até a Igreja do Rosário.

Imagem: Daniel Arrebola, 2019



LOUVAÇÃO DOS MASTROS

O Mastro é um símbolo sagrado, onde no passado os negros escravos e livres depositavam ali suas dores. Os congadeiros estão se preparando para a levantada do Mastro que marca o início da Festa Nossa Senhora do Rosário. Até que todos os mastros estejam em frente a Igreja do Rosário os ternos aguardam, cantam, dançam e oram pela festa que irá começar oficialmente em instantes. Os congadeiros vão se aproximando da Praça da Igreja para a fincada do mastro. Momento de muita expectativa entre todos os presentes. Os minutos antecedentes a esse evento são de muita devoção. Todos querem tocar no mastro, afinal há muitas histórias a respeito do poder que esse símbolo carrega. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2019



BENÇÃO DOS MASTROS

Pouco a pouco os ternos vão chegando. Os Moçambiques de cada reino vão trazendo os mastros que serão erguidos em frente a Igreja do Rosário. O pároco abençoa com água benta e orações os mastros que serão levantados ao seu sinal.

Imagem: Daniel Arrebola, 2022

SUBIDA DOS MASTROS

Enfim, o momento mais esperado

Os olhares fixos nos mastros

As bandeiras fazem guarda

Os instrumentos vibrantes

Os tambores vivos

As gargantas cantam louvores

Os devotos prendem a respiração

Toda a cidade está atenta

Os mastros se levantam

O pároco informa:

“Está aberta a Festa do Rosário”

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




MASTROS ERGUIDOS

Todos os mastros estão em pé, majestosos e ornamentados, embelezando a praça e abençoando Dores do Indaiá.

Agora serão quatro dias de cantos, danças e devoções!

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




PROTEÇÃO DOS MASTROS ERGUIDOS

Muitas histórias sobre intenções ruins referente aos mastros correm entre a vida dos congadeiros. As bandeiras de todos os ternos das comunidades servem para proteger o mastro que foi erguido.

Imagem: Daniel Arrebola, 2019.




CAVALHADAS

As Cavalhadas são outra linda manifestação cultural que compõem os momentos da Festa do Rosário. Seu propósito histórico é o de divertir o reinado que acompanha a festa e os devotos. Cada lanceiro deve vir cavalgando pela pista e tentar pegar as argolas e prendas com a ponta de sua lança. Quando a Rainha Perpétua está no local em geral a primeira prenda é presenteada a ela. Os lanceiros, ou cavaleiros, devem ser habilidosos. É preciso correr na pista em alta velocidade e com destreza conseguir conquistar uma argola. Em seguida é preciso controlar seu cavalo para voltar à fila e tentar uma nova prenda. Na Cavalhada todos os cavalos são ornamentados com cores variadas, geralmente com enfeites de fitas ou papel crepom, formando essas lindas imagens da cultura popular. Ao final das Cavalhadas a cidade vive a expectativa do dia seguinte, em que os ternos sairão enfeitados para a visita a casa dos devotos. A Igreja de N. S. do Rosário, ao fundo, guarda os lanceiros.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019






BENÇÃO DO CAPITÃO CARLINHOS

No segundo dia, na alvorada, dançantes começam a se reunir nas sedes dos seus ternos. Os participantes do Moçambique da comunidade Juiz de Fora, do capitão Carlinhos, aguardam a saída do terno e vem receber a sua benção especial. Enquanto aguardam seu momento com Capitão, os congadeiros vão ao altar presente em sua casa para pedir a proteção da virgem do Rosário e dos santos e santas! Capitão Carlinhos recebe um a um de seus congadeiros e devotos para uma benção que é dada em sua própria cozinha.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019



COROAÇÃO DE NOSSA SENHORA, CAPITÃO CARLINHOS

Os congadeiros que chegam para a saída do Moçambique do Capitão Carlinhos vão até a imagem de Nossa Senhora para pedir sua benção. A concentração na casa do Capitão é marcada por muita emoção e devoção. É o presságio das bênçãos e milagres que aconteceram pela intercessão de Nossa Senhora do Rosário. Após as bênçãos de todos os congadeiros e devotos que o procuraram, Carlinhos vai para o lado de fora de sua casa, a sede do Moçambique, e irá fazer cantos para a saída do terno.

“Que bandeira é essa?

Oh meus soldados,

Que bandeira é essa?

Oh, de promessa

Oh, de promessa

Oh!”

Para dar início aos trabalhos do terno, sobre as bênçãos de Maria, todos os congadeiros se abençoam nas bandeiras de promessa. O momento antes da coroação da imagem de Nossa Senhora, do Moçambique, é um momento de reflexão e pedidos para a Festa daquele ano. Capitão Carlinhos sempre reflexivo e orante. O Moçambique é abençoado para a sua saída com a linda coroação da imagem de Maria, feito em altar montado em frente a sede do terno.

Salve Maria!

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




SAÍDA DO MOÇAMBIQUE

Na saída do terno se formam duas gigantescas filas de congadeiros, de todas as idades. É de pequeno que nasce o amor pelo congado e a Festa do Rosário! Seguem a frente do Moçambique as bandeiras de promessa, abençoando a todos e anunciando a passagem do terno! A chegada do Moçambique na casa dos devotos é marcada por muita emoção e pedidos as bandeiras de promessa. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




TERNOS PELAS RUAS, CONGO REAL

Ao acompanhar um terno a casa do reinado é possível encontrar outros congados por todas as ruas de Dores do Indaiá. No caminho do Moçambique do Bairro Juiz de Fora encontramos o Congo Real do Juiz de Fora. O Congo Real traz como características marcantes seus fardamentos ricos de grandes penachos, cores e fitas. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




CASAS DOS DEVOTOS

Agradecimentos, saudações e emoção estão marcados por toda a cidade nas faixas, cartazes e altares feitos pelos devotos para a Festa do Rosário.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




CORTEJO DOS TERNOS A IGREJA DO ROSÁRIO E A NOSSA SENHORA, CONTRADANÇA

Esta é a Contra-Dança. Antigamente as mulheres não podiam dançar nos congados. Como forma de representá-las, os homens deste terno usam roupas femininas. Atualmente todos os ternos podem ser compostos por mulheres!

Imagem:  Ana Paula Pereira, 2019




CATUPE TAMBORIL

O Catupe Tamboril sempre se destaca com suas muitas cores e fitas em seus chapéus feitos artesanalmente pelos congadeiros.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




RAINHA PERPÉTUA

Dona Ivanir, Rainha Perpétua de Dores do Indaiá, está sempre animada e disposta para o acompanhamento de cada momento da Festa do Rosário. No segundo dia de festa ela está impecavelmente paramentada e logo pela manhã acompanha a chegada dos ternos na Igreja do Rosário.

Imagem: Daniel Arrebola, 2022




CORTEJO AOS SANTOS

Neste segundo dia, todos os ternos devem visitar a Igreja de Nossa Senhora do Rosário para fazer sua entrada, passagem pela imagem que está em frente ao presbitério, louvá-la e então seguir para suas atividades da Festa.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




VISITAS ÀS CASAS DOS REIS E RAINHAS

Durante todo o dia os ternos estão visitando os Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas. Os ternos da comunidade Antônio Martins chegam na casa dos Reis para fazer suas danças cheias de rodas e ciranda ao som bem animado!

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




CORTEJO DO REINADO PARA A PROCISSÃO CONGADEIRA

A tarde do sábado reserva um dos momentos mais esperados da Festa do Rosário. A gigantesca procissão congadeira! Aos poucos os ternos vão em direção ao Morro da Capelinha para a concentração. Os Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas vão chegando para a saída da procissão e enquanto isso são animados pelos ternos que vão se juntando. Algumas guardas da cidade de Quartel Geral também somam a Festa do Rosário de Dores do Indaiá. Toda a cidade se movimenta para a procissão congadeira, principalmente o reinado. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




CONCENTRAÇÃO NO MORRO DA CAPELINHA

Na Capelinha de São José as imagens são preparadas nos andores e a Rainha Perpétua aguarda e saúda a todos que chegam. O Moçambique da comunidade São José faz as louvações e cantos para a saída da procissão, onde eles serão os guardiões das imagens dos santos. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




PROCISSÃO CONGADEIRA

A procissão congadeira, gigantesca, caminha pela cidade seguindo protegida pelo Moçambique. Congadeiros e devotos se revezam para carregar os andores dos santos. Vista do alto a procissão congadeira parece interminável, colorida, alegre e enchendo Dores do Indaiá de vida e fé!

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




LOUVAÇÃO AOS SANTOS

A noite vai caindo e com ela a procissão congadeira vai se aproximando da Igreja de Nossa Senhora do Rosário para que os ternos façam suas apresentações aos santos. As louvações aos santos e santas também são feitas por jovens e crianças que participam dos congados, trazendo as tradições herdadas por seus pais e mantendo viva a cultura popular. Dona Ivanir, a Rainha Perpétua, também se faz presente para ver a exibição dos ternos e louvar os santos e santas. Uma a uma as guardas passam em frente ao altar com os santos para dançar, cantar e louvar. 

Imagem: Daniel Arrebola, 2022




PREPARAÇÃO DOS ANDORES

Não podemos jamais esquecer das pessoas envolvidas nos bastidores desta linda festa. Nesta imagem os voluntários e funcionários da paróquia de N. S. das Dores preparam o altar após a chegada dos andores da procissão congadeira!

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




COROAÇÃO DE NOSSA SENHORA

Após a procissão congadeira, da apresentação dos ternos e da missa, eis o momento aguardado. A coroação da virgem do Rosário e a queima de fogos!

Imagem: Daniel Arrebola, 2022




CHEGADA DO REINADO PARA O PASSAMENTO DAS COROAS

No terceiro dia de festa, enquanto o reinado vai chegando para o passamento das coroas, a Contra Dança anima a todos do lado de fora e congadeiros de vários ternos participam da brincadeira do pau de fitas. No centro da praça do Rosário, outros ternos fazem seus cantos e louvações à imagem de virgem do Rosário, na fonte da praça, e outros congadeiros e congadeiras entram na grande roda para louvar também.

Imagem: Daniel Arrebola, 2019




LOUVAÇÃO AOS SANTOS ANTES DO PASSAMENTO DAS COROAS

Enquanto alguns ternos cantam, dançam e louvam na praça da Igreja do Rosário, outros ainda chegam conduzindo o reinado para dentro da Igreja para o momento do passamento das coroas. Dentro da Igreja do Rosário os congadeiros e o reinado são recebidos pelos olhares doces dos santos e santas e, a eles, pedem bênçãos. Os ternos entram na Igreja conduzindo o reinado e fazendo seus cantos e louvações!

Imagem: Daniel Arrebola, 2019



PASSAMENTO DAS COROAS

No momento do passamento das coroas o atual reinado passa as tarefas a serem assumidas para as novas e novos Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas, através das suas lindas coroas! 

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




PAGAMENTO DAS PROMESSAS

Após o passamento das coroas os ternos saem para dar voltas em torno da Igreja do Rosário e pagar as promessas feitas. Os congadeiros cantam e louvam em agradecimento às bênçãos recebidas. No Congado, o choro e as lamentações dos escravos são representados através do som ritmado das gungas. Este instrumento é tradicionalmente usado junto aos pés dos dançantes do Moçambique!

Imagem: Daniel Arrebola, 2022




BENÇÃO DAS BANDEIRAS E MISSA FINAL

No último dia de festa, antes da esperada descida dos mastros, os ternos levam suas sagradas bandeiras a Igreja do Rosário para uma benção especial. As bandeiras são abençoadas durante a missa de encerramento da festa. Neste momento, os congadeiros presentes na celebração se encontram em profunda sintonia com sua fé e agradecidos pelos dias de festa vividos.

Imagem: Ana Paula Pereira, 2019




DESCIDA DOS MASTROS

Pouco a pouco os ternos chegam à Igreja para a benção das bandeiras e logo depois a descida dos mastros. Todos os ternos da cidade irão entrar na Igreja do Rosário para trazer suas bandeiras, fazer seus agradecimentos aos santos e aguardar o momento do término da festa. Do lado de fora da Igreja do Rosário, devotos, crianças e congadeiros aguardam com ansiedade pelo final que se aproxima. Os Moçambiques começam a se preparar ao lado de fora. Eles são os guardiões do início e fim da Festa do Rosário. 

Olhares fixos e brilhantes, mãos em direção aos mastros que descem lentamente, misto de alegria, saudade e tristeza. Os devotos aguardam para tocar os sagrados mastros e pegar um pedaço de fita, um enfeite, uma flor ou qualquer outro elemento abençoado pelos santos. Enfim, os mastros começam a descer.

A descida é rápida, mas para os devotos que tem seus olhos fixos para o alto, parece acontecer em câmera lenta.

No topo de cada mastro um santo vai pendendo em queda livre.

No chão da praça as crianças fardadas de congadeiras erguem suas mãos.

O Moçambique pede à Virgem do Rosário um último momento de proteção.

Vão caindo os mastros.

Lágrimas, orações, olhos fixos.

Os mastros deitam e são abraçados pelos devotos.

Seus enfeites tornam-se novos amuletos na espera da Festa do ano que vem.

Ao fundo ouve a voz do padre:

“Declaro encerrada a Festa do Rosário!”

Imagem: Daniel Arrebola, 2019



Caso tenha interesse em saber um pouco mais sobre essa Festa e ver mais fotos, acesse o Instagram @congados.exposicaovirtual.




OS REALIZADORES:


DANIEL ARREBOLA

Daniel Arrebola é Antropólogo de formação (PUC-Rio, 2014) com ênfase em Antropologia, Arte e Cultura e
atualmente doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais pela UFES (PGCS/UFES). É colaborador
da Unidade Experimental de Som e Imagem da UENF (UESI/CCH/UENF).

Desde a graduação até o doutorado atua no campo da antropologia visual, somando a pesquisa de campo com a
fotografia e a produção audiovisual. Seus principais campos de atuação estão na região sudeste, com trabalho com as mais variadas expressões da cultura popular, como as Folias de Reis, Congados, Pescadores Artesanais, Jongos, Samba de Bumbo, Cavalhadas e muito mais.





ANA PAULA PEREIRA

Ana Paula Pereira é bióloga (FAESA, 2011) e Especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo (FAJE, 2016). Atua diretamente com os pescadores artesanais da região dos lagos fluminense através de seu vinculo com a Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ).

Através de sua atuação profissional com as comunidades pescadoras e de sua participação no projeto de extensão “Educação continuada em multimídia, arte e cultura” pelo Centro de Ciências do Homem da UENF (UESI/CCH/UENF), Ana Paula produz imagens que procuram marcar a essencialidade das ações laborais e das expressões dos agentes de cultura popular.




Livro de Registro de Presença

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